No Caniço, a tradição de semear cebola perdura, entre prédios, modernidade e histórias de vida feitas de suor e amor pela terra.

cebola

Quem os vê ao longe, debruçados sobre a terra, debaixo de um chapéu improvisado para fazer frente ao sol abrasador, não fica indiferente ao quadro. E vale de facto a pena atravessar os poios, separados da estrada por muros empedrados, para saber mais sobre a família Coelho cujo historial a cuidar da terra já ultrapassa os 30 anos.

É final de Abril e no Caniço já se procede à apanha da cebola. A poucos metros do coração da cidade, os pequenos retângulos de terra preservam a ruralidade deste território que é hoje um dos grandes núcleos populacionais da ilha da Madeira.

O dia é de sol ameno mas, para quem trabalha a terra, o calor perturba e agudiza o cansaço. Acocorados sobre o solo, Célio, a mãe, o pai e um amigo da família apanham cebolas, refreando o cansaço com dois dedos de conversa.

“A nossa família sempre se dedicou à terra e ao cultivo da cebola em concreto. Posso dizer-lhe que nós próprios selecionamos a semente de ano para ano. Não compramos sementes há mais de 20 anos”, afiança com orgulho Célio Coelho.

Ao lado do filho e companheiro de trabalho, como sempre esteve ao longo da sua vida dedicada à agricultura, Lídia só desvia os olhos das cebolas para corroborar Célio que divaga, entretanto, sobre “a qualidade superior do produto” ali semeado.

Terreno aluga-se
‘Bujanico’ e ‘Peão’ assim se designam duas das espécies mais comuns no Caniço. “Sabe que as sementes vão se adaptando às caraterísticas da terra e a verdade é que se as plantarmos noutra zona não vingam da mesma forma”, explica Célio Sousa.

O agricultor conta tirar, este ano, 8 toneladas de um terreno no Caniço de Baixo. Há 30 anos que é assim, a família Coelho ‘aluga poios’ para explorar. Nos dias de maior volume de trabalho, contratam pessoas pagas à hora para repartir o trabalho e assim se perpetua a tradição de cultivar a terra, uma profissão difícil, outrora mais rentável, mas sempre associada a uma grande dose de espírito de sacrifício e amor pela natureza.

Por hora, é só a família Coelho a apanhar cebolas sob o sol de Abril. “Apanhamos e descabeçamos (tirar a rama) antes de as recolher”. Célio prossegue as explicações, com agrado, embrenhado na conversa que o salva, por instantes, do mecanicismo da tarefa.

É tempo de partir. Afastamo-nos lentamente, por entre os poios e bonitas paredes de pedra. Logo abaixo os carros circulam a grande velocidade, indiferentes às gentes genuínas que trabalham a terra. No horizonte, o azul do mar é intenso.

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