Sim, se…

Sim, se…

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Gonçalo Santos / Profissional de comunicação

Em Moçambique, 66,5% da população tem menos de 25 anos. Esta será uma das nações mais jovens do mundo. Com taxas médias de crescimento económico de 15%, nos últimos dez anos, o país começa a ser olhado com interesse por grandes investidores internacionais, em várias áreas. O facto de Moçambique ser um dos estados mais ricos do globo no que respeita ao gás natural – as reservas disponíveis dariam para sustentar, em conjunto, dois países com a dimensão da França e da Alemanha, durante duas décadas – e ao carvão, que sustentaria toda a União Europeia durante 25 anos, ajuda a avivar o interesse.

Moçambique tem um potencial turístico impressionante. A costa é belíssima, as reservas naturais são relevantes, a população é extraordinariamente simpática, na generalidade, o que compensa sobremaneira as insuficiências do serviço.

No que respeita à cultura, os jovens artistas moçambicanos começam a perceber a importância de construir uma linguagem própria, muito influenciados pela figura ímpar que foi Malangatana e cada vez mais longe dos estereótipos da guerra. Basta ir ao Núcleo de Arte, em Maputo, para perceber a vibração.

A ex-colónia portuguesa pode dar algumas lições ao mundo. Uma delas é sobre tolerância religiosa. Por cá, muçulmanos, católicos, ateus e crentes de outros deuses coabitam sem o mínimo atropelo. Sem qualquer tipo de discriminação.

Porém, nem tudo são rosas. Moçambique é formalmente uma democracia, necessitando, porém, de dar passos rumo a uma “normalização democrática”, o que não deixa de ser compreensível, face à história dos primeiros anos de independência. A imprensa verdadeiramente livre é minoritária. A corrupção é visível, mesmo a um recém chegado.

As infraestruturas são fracas ou nem existem. O país tem uma rede de estradas insuficiente. Sair de Maputo, muitas vezes, significa percorrer horas infindáveis em picadas de terra.

Os transportes públicos (autocarros) são residuais, mesmo na capital. A maioria dos moçambicanos apinha-se em “chapas” ou na carga de veículos de caixa aberta, por cá conhecidos como “my love”. Segurança e conforto são conceitos muito relativos.

As disparidades sociais são enormes, mesmo vistas à lupa de um europeu do sul. A percentagem de literacia é de 50,6% (inferior à media da África subsariana, que é de 58,9%). A taxa de abandono escolar no decurso do ensino primário atinge o impressionante score de 69,4%. Cerca de 69% da população vive em áreas rurais e desta, 81% vive da agricultura de subsistência. A taxa de desemprego é de 22,5% e a economia informal alimenta 75% dos moçambicanos, representando aproximadamente 40% do total do PIB do país.

Se tivesse de descrever os nossos irmãos de Moçambique, alegria seria a primeira palavra que me ocorreria. Gostam de música, de dança, de festa. E de falar. Muito. Com qualquer pessoa que encontrem. É quase impossível dar com um moçambicano calado.  A não ser que esteja a dormir.

São dos povos menos individualistas que já vi. Todas, ou quase todas as atividades, são feitas em grupo. Cantam, dançam, viajam, riem, choram,  comem, nascem, morrem, vivem, em grupo.  Daí que a noção de privacidade seja uma espécie de corpo estranho.

“Acreditas no futuro deste país”? perguntaram-me recentemente.

Não consegui responder sem alguns “ses”. Se a paz se mantiver, sendo para isso necessário diminuir as assimetrias sociais. Se a corrupção for mais controlada – neste aspecto, as notícias nos jornais dão conta de diversas ações com esse objetivo. Se os índices de abandono escolar caírem a pique. Se o ensino melhorar. Se as infraestruturas começarem a ganhar forma. Se, se, se…

Gostaria de dizer que sim, que acredito plenamente que Moçambique tem um futuro promissor. Mas digo “sim, se”. Resumindo, tenho uma espécie de crença… condicional. Mas gostava muito que este país se desenvolvesse. Afinal, gosto (mesmo muito) dele.